O pesado “lobby” que atua a favor da privatização dos serviços aeroportuários é antigo e conhecido. Desde os tempos de ouro da hegemonia da agenda do Consenso de Washington que os representantes do setor privado vêem com olhos gordos essa verdadeira mina de fazer dinheiro fácil, às custas do monopólio dos bens públicos. Nos tempos em que o discurso contra a presença do Estado na atividade econômica era considerado irreparável esse foi um setor que conseguiu resistir e não ser repassado à exploração pelo capital. Uma das razões para tal fato refere-se, sem sombra de dúvida, à natureza estratégica dos aeroportos e de sua tangência evidente com as questões de segurança e soberania nacionais.
E, ao que tudo indica, setores expressivos das Forças Armadas nunca foram muito simpáticos à idéia de transferir tal atividade ao setor privado. Mas os interesses empresariais não haviam desistido de tal projeto e estavam apenas à espreita para saltar em cena no momento adequado. Quis a ironia da historia, que tal oportunidade fosse oferecida, assim de bandeja, justamente por um governo comandado pelo Partido dos Trabalhadores.
Por outro lado, a realização da Copa do Mundo em 2014 e os compromissos assumidos pelo Brasil perante a FIFA e a comunidade internacional passaram a atuar como elemento de reforço da versão catastrofista. E mais uma vez o discurso em favor da eficiência do setor privado prevalece. O tempo é curto, as necessidades são urgentes, não existe alternativa viável que não seja a privatização – os argumentos se repetem. Assim, em função de um fluxo aéreo extraordinário e concentrado durante tão somente um mês da competição, decide-se por transferir toda a operação dos aeroportos, por décadas, para o capital privado.
Serão leiloadas as concessões dos aeroportos de Guarulhos (SP), Brasília (DF) e Campinas (SP). Esses três são considerados dentre os mais rentáveis e os menos problemáticos de todo o conjunto da Infraero. As condições são as melhores possíveis para os interessados. Tanto que o preço inicial solicitado no leilão do aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN) foi largamente superado durante o leilão realizado em agosto de 2011. Naquela espécie de experiência piloto dessa nova onda de privatização, o valor pago pelo consórcio vencedor foi quase 230% superior ao preço inicial fixado pelo governo.
O principal argumento utilizado pelo governo para lançar mão da privatização é a tão propalada falta de verbas para investimento. Porém, a verdade dos fatos desmente essa versão enganosa. Recursos sobram no Orçamento! O problema é a prioridade definida pelas autoridades para sua utilização. Encerradas as contas de 2011, por exemplo, apurou-se que o Estado brasileiro forçou a geração de um superávit primário no valor de R$ 130 bilhões ao longo do ano. Uma loucura! Mais de 3% do PIB destinados exclusivamente para o pagamento de juros da dívida pública. Um número que se revela 30% mais elevado do que o superávit de 2011. E agora basta uma simples comparação. A operação de privatização desses 3 aeroportos vai render R$ 240 milhões por ano aos cofres da União. Ou seja, se houvesse destinado apenas minguados 0,2% do superávit a cada ano para esse importante compromisso, não precisaria transferir a concessão dos aeroportos ao capital privado. Mas a vida é feita de escolhas. E elas revelam a essência de nossas verdadeiras vontades.
O resultado final das privatizações revelou um aspecto peculiar do programa brasileiro: algumas aquisições somente foram feitas porque contaram com a participação financeira dos fundos de pensão das próprias empresas estatais (como no caso da Vale) ou da participação de empresas estatais de países europeus. O controle acionário da Light Rio, por exemplo foi adquirido pela empresa estatal de energia elétrica da França.
Ao longo dos oito anos de mandato de Fernando Henrique Cardoso, as privatizações lograram atingir a receita total de 78,61 bilhões de dólares, sendo 95% em moeda corrente (nessa percentagem estão incluídos os financiamentos concedidos pelo BNDES), e com grande participação dos investidores estrangeiros, que contribuíram com 53% do total arrecadado. Deste total, 22,23 bilhões de dólares referem-se à privatização do setor elétrico e, 29,81 bilhões de dólares à do setor de telecomunicações.
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